sábado, 13 de julho de 2013

JANGADA DE PEDRA II

eu também somos ibéricos
perdidos numa jangada
navegando sobre margens
parando tanques na praça
gritando tintas nos muros
calando apenas a nada
multiplicando com foice
dividindo à martelada

eu também somos ibéricos
esculpidos em halabja
permutando nossos pés
por madeira mais barata
que onde mais se pisa em falso
a raiz da pele é magra
mas dura pra sustentar
boicotes e chicotadas

eu também somos ibéricos
repartindo nossos bálcãs
apedrejando moinhos
por oliveiras roubadas
ilhados por um bloqueio
cegos ao charme das balsas
revestidos por ideias
indissolúveis à bala

[II07MMXIII]

NO CALOR DA HORA

este é o meu partido
correndo sem rumo
saindo dos trilhos
em cima de muros
sempre dividido
em rosas e murros

este é o meu partido
navio sem prumo
navega entre gritos
aporta em sussurros
ancora no umbigo
faz coro com o mundo

eu sou o meu partido
um porto inseguro

[XVIII06MMXIII]

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

ESTADA

algumas respostas
ainda estão no pé
tem um longo caminho
até que eu possa
venturosamente
colhê-las pra te dar

até já fabriquei
em passados distantes
principalmente
uma resposta aqui
uma outra ali
mas desta vez não

agora serei vassalo
nas tuas terras
lançarei no teu solo
todas as minhas letras
até que os teus freixos
nasçam com meu nome
gravado em seus troncos

também ficarei
trabalhando meu solo
semeando teu nome
até que minhas árvores
acordem como a cana
com teu nome e teu gosto
encravados em si

[17VIII2011]

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

RITA HAYWORTH AND THE SHAWSHANK REDEMPTION


querer-te-ia aqui
misturada com o café
querer-te-ia aqui
entre as fatias do pão
querer-te-ia aqui
no enredo do filme
que me distrai na tevê

querer-te-ia além
como a cafeína
que dá sentido ao café
querer-te-ia além
como a pimenta
que põe fogo no recheio
querer-te-ia além
como a cena que precisa
virar pôster na parede

querer-te-ia mais
como a sede de espírito
que me leva à xícara
querer-te-ia mais
como a fome de malícia
que semeia a chama
querer-te-ia mais
como um sonho de liberdade

[20VIII2011]

terça-feira, 9 de agosto de 2011

ENCONTRO

sempre espero
que venhas vestida
com uma blusa madura
uma calça razoável
sandálias decididas
maquiagem clara
e batom solúvel

e se possível
espelho nos olhos
pra refletir o brilho
que emana dos meus
quando te veem

a bem da verdade
prefiro que venhas
com os pés nus
apenas calçados
com os calos das batalhas
que tu ousaste
e o corpo entrecoberto
com vestido pintado
por delacroix

e na mão direita
pra nos conduzir
a bandeira deve ter
apenas a cor azul
e a mão esquerda
deve estar desarmada
aberta apenas
para aceitar as linhas
revolucionárias
da minha mão

[06VIII2011]

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

QUOTIDIANUS

se me desses um sorriso
agora de manhã
eu te faria o desjejum
eu pagaria o teu almoço
eu seria a tua ceia

se me desses teu sorriso
agora de manhã
eu te faria um poema
com um verso inadvertido
pra te estragar de vez

e agora de manhã
se tu desses pra mim
aquele sorriso secreto
eu nem aguentaria
eu perderia as estribeiras

[01VIII2011]

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

ESBOÇO

não sei fazer maquetes
não sou de projetos
não calculo nada
além de saudades

sou talvez poeta
como chico buarque
e talvez possa
escrever um esboço

posso ser profeta
do nosso futuro
rimando com tuas cores
meus versos pálidos

e nesse esboço
eu sempre estaríamos
assim na primeiríssima
pessoa do plural

e independentemente
de onde nos abrigássemos
o melhor lugar
seria ao teu lado

a melhor parede
não seria pintada
com nada além
dos nossos versos

a melhor cama
não teria lençóis
que não nos confundissem
os suores e os frios

o melhor sofá
miraria a tevê desligada
refletindo nós dois
fazendo cinema

e seria um esboço
sempre esboço
nunca acabado
sempre por fazer

e a cada verso
eu me escreveria
certamente teu

e em cada estrofe
eu te escreveria
de repente minha

 [22.VII.2011]

segunda-feira, 25 de julho de 2011

NESSA VIDA

eu quero a sorte
de construir um amor novo
que não acabe ao fim do dia

que seja firme
como um adeus definitivo
como a palmeira que se inclina

que saiba bem
pôr sal em doces imaturos
e muito açúcar nas feridas

que saiba bem
como chiclete de segunda
e sobremesa dividida

[24VII2011]


"Eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida." [Cazuza/Frejat]

domingo, 24 de julho de 2011

ATRASO

eu te queria mais cedo
antes de a insegurança
me subir pelas pernas

eu te queria mais cedo
antes de o teu perfume
escapar dos lençóis

eu te queria mais cedo
antes de o relógio
fingir não ter corda

eu te queria mais cedo
antes de a saudade
perder os seus sais
perder seu desejo
perder a esperança

[16VII2011]

TREVAS

às vezes
na sombra
fico bonito

sem descartes
galileu
newton

sem diderot
voltaire
montesquieu

talvez
mais sombra

onde eu
ou qualquer
me se
escondesse

[29IV2011]